Por Jefferson Kiyohara (*)
Organizações que estão atentas às demandas do mercado e dos stakeholders sabem da importância dos pilares ESG (Ambiental, Social e Governança, em português) e de ser sustentável. É fato que há uma nova onda acontecendo e muitas organizações têm buscado informações a respeito. Mas, enfim, por onde começar?
O primeiro ponto relevante é entender as motivações da empresa e alinhar as expectativas. Não se cria um programa de sustentabilidade da noite para o dia, assim como não existe um kit pronto que pode ser aplicado em qualquer organização e rodar no dia seguinte. Se existir, é um programa de fachada, que não traz benefícios reais. Isso porque a cultura requer tempo para ser moldada, as pessoas levam tempo para incorporar uma nova forma de pensar e trabalhar e os processos precisam ser adequados para esta nova realidade.
Outro ponto inicial importante é ter claro que o rating ou relatório é consequência, já que a organização só pode ser avaliada ou fazer reporte de ações que já existam. Logo, não é possível começar um programa de sustentabilidade efetivo pelo relatório. Além disso, o relatório não deve ser o propósito final, mas sim ter as estratégias e ações sustentáveis e conscientes que serão posteriormente apresentadas. É também um erro publicar um relatório visualmente bonito, mas com conteúdo completo ou inconsistente.
Vale destacar que o ESG não se trata apenas de uma ação de marketing e de vender uma imagem positiva. Na verdade, é uma forma de repensar todo o negócio, suas soluções e sua forma de lidar com todos os envolvidos, indo além dos interesses dos acionistas pelo lucro imediato ou dos executivos pelo bônus do próximo ano, considerando também colaboradores, clientes, fornecedores, sociedade e outras partes interessadas. É preciso entender que há limites, recursos naturais finitos e impactos diretos e indiretos de todas as ações feitas. É agir com ética e respeito com as pessoas, as organizações e o planeta.
Ter o patrocínio da alta direção é fundamental para a iniciativa ESG tomar corpo na organização. A visão, a estratégia, os processos e as priorizações, tudo é impactado por um programa ESG. E se isto não acontece é porque o programa não é efetivo e, infelizmente, ainda há muitos deste tipo. Não é fácil ter uma atuação holística e completa, pois requer investimentos, amplo envolvimento, atuação multidisciplinar, integração, coordenação e coerência.
É fácil, por exemplo, uma montadora do setor automobilístico fazer um relatório e dizer que preza pela qualidade de seus produtos e sustenta isso mostrando um alto percentual de estrelas nos testes de segurança nos Estados Unidos e na Europa, mas, quando analisamos os produtos feitos para a Índia ou Brasil, a prática mostra que há casos nos quais os resultados não se mantêm.
O caminho para ser sustentável se inicia com a realização de um bom diagnóstico, que deve cobrir o entendimento das ações já existentes, mas sem se limitar a isto. Mostrar o que já existe de bom é importante, mas é apenas parte do processo. Contentar-se é aceitar um engodo e ser cúmplice.
Felizmente, vemos uma crescente de profissionais e organizações que levam o tema ESG com seriedade, mudando o cenário corporativo. Neste contexto, é importante que o diagnóstico contemple também o entendimento do negócio, da estratégia, uma análise SWOT (Forças, Fraquezas, Oportunidades e Ameaças) focada e o mapeamento considerando a dupla materialidade para enxergar os gaps e as oportunidades.
A análise de materialidade deve considerar o ponto de vista dos stakeholders e, ao mesmo tempo, conversar com a matriz de riscos corporativos, prática essencial e ainda pouco adotada nas empresas, infelizmente. Impactos das mudanças climáticas, disponibilidade e uso da água doce e potável, emissões de carbono e redução da biodiversidade aparecem (quando aparecem) nos relatórios de sustentabilidade, mas raramente nos relatórios e matrizes de riscos estratégicos, o que demonstra clara inconsistência. O Fórum Econômico Mundial já deixou claro que são pontos que devem ter atenção prioritária. Os reais impactos muitas vezes não são demonstrados por conflitos de interesse, mas, felizmente, o espaço para este tipo de manobra vem diminuindo.
Ser ESG é pensar no presente e no futuro, na continuidade e na sustentabilidade dos negócios, adequando-os para os novos tempos e limitações que virão, independentemente da vontade da humanidade. É moldar o mundo que virá e nele se integrar. E sua organização, está preparada?
(*) Jefferson Kiyohara é diretor de Compliance & Sustentabilidade na ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance, ESG, auditoria interna, investigação e proteção e privacidade de dados.