Por Daniela Coelho (*)
Olhando rapidamente os últimos relatórios anuais de sustentabilidade ou de ESG (Ambiental, Social e Governança, em português) de algumas empresas, podemos identificar vários temas materiais em comum, entre eles o que se refere à cadeia de fornecedores, que pode aparecer nos relatórios com outros termos, como “transparência e origem de produtos” ou “comunidades fornecedoras”. Independente da nomenclatura, o ponto que queremos refletir é sobre o porquê de a cadeia de fornecedores fazer parte desses relatórios.
Ao falarmos de temas materiais, como citado acima, queremos dizer que se trata de um tópico relevante e que é suficientemente importante para que conste nos relatórios ESG, pois refletem impactos positivos ou negativos – gerado pela organização no meio ambiente ou na sociedade.
Temos visto que a cadeia de fornecedores é considerada relevante para muitas empresas dentro dos critérios de materialidade. Sabemos que toda empresa que possui algum tipo de contratação, seja de recursos, insumos ou serviços, é dependente de uma cadeia de fornecimento eficaz e econômica. Se for mal gerida, pode trazer impactos negativos, incluindo perda financeira, reputacional, interrupção de fornecimento, baixo desempenho nas entregas, ineficiência, risco legal e regulatório e, até mesmo, fraude.
A gestão de sustentabilidade das empresas não está limitada a suas operações diretas, sofrendo uma enorme influência pelas operações de seus parceiros e fornecedores. Nesse cenário, as empresas estão buscando fornecedores que sejam eticamente responsáveis, cujos produtos e atividades minimizem os impactos sociais e ambientais. Essa preocupação pode ser notada em várias fases ao longo do ciclo de relacionamento, que podem ser listados a partir de exemplos como:
- Seleção do fornecedor – é comum vermos a participação da área de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) na busca de empresas que possam trazer soluções mais sustentáveis, como priorizar fornecedores que tenham opções recicláveis, como uso de matérias-primas mais “verdes”, por exemplo, além de avaliar se o fornecedor utiliza algum item presente na lista vermelha do MMA (Ministério do Meio Ambiente), contendo espécies da flora brasileira ameaçadas de extinção, que inclusive pode ocasionar sanções em relação ao código penal.
- Diligência – os processos de due diligence não focam somente em questões anticorrupção, sendo possível ampliar as pesquisas para verificar a situação da empresa em listas relacionadas a processos trabalhistas e ambientais, assim como outras situações ligadas a alguma restrição da empresa.
- Monitoramento do fornecedor – algumas empresas já possuem processos robustos de auditorias de fornecedores, contemplando aspectos ambientais, como a obtenção de licenças e de desenvolvimento de política ambiental, por exemplo; sociais, como atendimento à legislação trabalhista e à saúde e segurança dos colaboradores; e, por fim, os aspectos relacionados ao compliance e à gestão da ética, como a existência e disseminação de código de conduta e observação à Lei Anticorrupção, entre outros.
Os critérios são diversos e podem ser adaptados de acordo com a categoria e o grau de risco do fornecedor. É importante destacar que os exemplos acima não têm a intenção de serem exaustivos e de prever todas as situações, mas servem de orientação para que as empresas possam buscar uma evolução de seus processos e relacionamento com fornecedores.
Há ainda um bom caminho a ser percorrido. Acompanhando recentemente um webinar de uma empresa de consultoria global sobre Supply Chain e ESG, foi possível identificar um baixo nível de maturidade no tema. Em uma das questões feitas ao público, 77% dos respondentes afirmaram que desconheciam a adoção de critérios de ESG na gestão de fornecedores. É lógico que se trata de uma consulta informal, durante uma transmissão ao vivo, mas o alto percentual para esta pergunta mostra que o assunto ainda não está disseminado.
Para robustecer a conexão entre os aspectos de sustentabilidade e a gestão de fornecedores, a empresa pode revisar suas políticas incorporando a sustentabilidade como fator decisório. Identifique os riscos de acordo com a categoria do fornecedor, pois aquele que presta serviço talvez não tenha o mesmo tipo de risco de um que venda matéria prima, e estimule-os a trazerem soluções inovadoras. A busca por fornecedores socialmente e eticamente responsáveis - por produtos e serviços que minimizem o impacto social e ambiental de toda a cadeia e que considerem todo o ciclo de vida - podem gerar inúmeras possibilidades para novos designs de produtos e o fomento da economia circular.
Reforçando que ninguém faz nada sozinho, clientes e fornecedores podem aproveitar as oportunidades que as novas demandas de sustentabilidade estão estimulando no mundo dos negócios para gerarem soluções que sejam interessantes para ambas as partes e seus stakeholders. E, obviamente, para a sociedade e o planeta.
(*) Daniela Coelho é diretora associada de riscos e performance na ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance, ESG, auditoria interna, investigação e proteção e privacidade de dados.
Fonte: IMAGE Comunicação, em 03.09.2021