De acordo com especialista em direito tributário, cobrança seria indevida já que valor é indenizatório
A Receita Federal anunciou que pretende cobrar imposto de renda sobre as multas pagas ao Ministério Público Federal (MPF) por aqueles que assinaram acordo de delação premiada com a Operação Lava Jato e decidiram colaborar com a Justiça. Os valores, arcados pelas empresas envolvidas em esquemas de corrupção, seriam, segundo a Receita Federal, "parte da remuneração" e, por isso, rendimento tributável pelo imposto de renda.
A primeira avaliação sobre o caso foi publicada na Solução de Consulta nº 311, de 26 de dezembro de 2018, editada pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), mas ainda não há julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) sobre o assunto.
Mas a proposta da Receita, segundo advogado Daniel Strand, sócio da Strand Advogados, parte de um pressuposto equivocado sobre o ressarcimento da empresa para os colaboradores da justiça. De acordo com o especialista, nestes casos, os valores são indenizatórios, já que, os que estão colaborando com a justiça cometeram atos ilícitos com consentimento da empresa - ou mesmo instruídos por ela.
Por isso, são as companhias as responsáveis pelo pagamento da multa como um ressarcimento sob um gasto que o funcionário precisou ter e que só ocorreu por atos praticados sob ordem de sua chefia.
"Um exemplo que ilustra bem esse tipo de situação, mais factual, seria, por exemplo, o caso de uma companhia que marque um compromisso para o seu funcionário no dia em que o mesmo não pode comparecer, pois seu veículo está proibido de circular por conta do horário de rodízio. A empresa insiste. Caso o funcionário seja multado, a companhia teria a obrigação de ressarci-lo, pois o ato ilícito cometido foi com consentimento e, inclusive, a mando da companhia", exemplifica o advogado.
Se, neste caso, a empresa se recusasse a ressarcir o funcionário, ele poderia entrar na justiça requisitando o valor da multa. Assim como no caso dos colaboradores, tendo em vista que a multa só se fez necessária por prática de ato ilícito solicitado e com conhecimento da companhia. O não pagamento da multa pode também gerar um processo na Justiça do Trabalho. E, nesses casos, até com solicitação de danos morais.
"No caso dos que celebraram acordo de delação, além do dano material, ainda houve um dano moral, visto que, por conta de atitudes da empresa, o funcionário foi exposto na mídia como um infrator, tendo sua família também sofrido as consequências sociais, como bullying e assédio, de um crime comandado pelo empregador, e não o empregado", comenta.
Compensação, e não acréscimo
Strand afirma ainda que o Supremo Tribunal Federal (STJ) inclusive já entende que indenizações não são tributáveis, pois funcionam como mera recomposição patrimonial, não como uma nova fonte de receita. E alerta que, a cobrança do imposto pode inibir muitos de contribuírem com a justiça por medo de terem que pagar o imposto, causando danos ao seu patrimônio e da sua família.
"Inclusive, acredito que a cobrança possa levar a outros processos judiciais, como de danos morais por exemplo. Pois o acordo de delação já expõe muito a pessoa que, muitas vezes, cometeu atos só por orientação da empresa. Além dessa exposição, a pessoa não terá apenas o patrimônio atingido, como também se torna vulnerável a um linchamento moral que o acompanhará mesmo após o cumprimento de sua pena", comenta.
Sobre a Strand Advogados
Strand Advogados é um escritório especializado em advocacia empresarial tributária, voltado para a prestação de serviços de consultoria, planejamento e contencioso administrativo e judicial.
O escritório conta com equipes especializadas em tributos diretos, indiretos e em contencioso administrativo e judicial atendendo os mais diversos segmentos, incluindo grandes indústrias, varejistas, construtoras, empresas de tecnologia, fundos de investimento, instituições financeiras, prestadores de serviços e startups.
Fonte: Digital Trix, em 05.04.2019.