Por Fernando Braga (*)
O mundo corporativo, com suas metas, política de vendas, performance, visibilidade no mercado, prazos, dentre outras variáveis, absorveu a cultura do ESG (sigla em inglês para as práticas ambientais, sociais e de governança). Mas há outro conceito importante a ser incorporado, que envolve as áreas de Auditoria, Contabilidade, RH e Financeiro.
O centro de custo que gera lucro – chamado Gestão de Afastados, que compete ao Comitê Gestor Corporativo – deve reportar à direção empresarial relatórios para a melhor tomada de decisão na estratégia corporativa. Uma delas é a figura jurídica da decadência.
No dia 2 de fevereiro deste ano, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), através de seu órgão máximo, a Câmara Superior, proferiu acórdão favorável a uma empresa, reconhecendo a decadência, mesmo em recurso intempestivo. Para o Colegiado, decadência é matéria de ordem pública e pode ser reconhecida em recurso intempestivo.
O Carf decidiu a favor do contribuinte (empresa) em face da Fazenda Nacional, que cobrava tributos e contribuições tais como IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. O entendimento fora da 1ª Turma da Câmara Superior decidiu que a intempestividade do recurso de um contribuinte, ou seja, o recurso entregue fora do prazo legal, não impede a declaração de decadência do lançamento tributário.
O acórdão confirmou a tese de que a decadência é uma matéria de ordem pública, fato que permitiria o seu reconhecimento independentemente da tempestividade do recurso voluntário e assevera que a questão da decadência já foi superada na turma ordinária. Mesmo com a intempestividade do recurso voluntário, a decadência ocorreu de fato.
O caso em discussão, a contribuinte foi autuada por suposta omissão de rendimentos, o que ensejou cobranças de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Mesmo com o recurso voluntário apresentado fora do prazo, entretanto, a 2ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 1ª Seção decidiu, por unanimidade, pela decadência da cobrança feita pelo fisco.
No entendimento da turma ordinária houve de fato a decadência, independentemente de o recurso ser tempestivo ou não ter sido entregue na data correta. Para a Fazenda Nacional, entretanto, não é possível a análise da decadência de uma cobrança cuja contestação seja intempestiva por não respeitar o prazo de 30 dias de interposição de recurso. No caso em discussão, a contribuinte demorou 31 dias para apresentar o recurso voluntário.
Os integrantes da Câmara Superior discutiram se o tribunal administrativo poderia analisar a decadência, que faz parte do mérito, sem que o recurso fosse entregue dentro do prazo exigido pelo CARF.
“O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já deixa claro que matéria de ordem pública é passível de conhecimento a qualquer tempo nas instâncias ordinárias”. Os conselheiros afirmaram que, devido à polêmica em torno do tema, o caso em debate ainda provocará “futuras discussões na academia” e no próprio Carf..
Nessa esteira, é importante alertar para os casos de recursos, revisões e contestações no âmbito previdenciário. Exemplo claro de decadência e prescrição que pode gerar reversão de decisão administrativa do INSS por não observância das normas suplementares ao direito previdenciário.
Suponha que uma empresa tenha ingressado com a contestação do NTEP em tempo hábil, ou seja, dentro dos 30 dias da ciência do benefício, após o segurado do INSS (funcionário da empresa) reconhecer o pedido de auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) e a perícia médica federal entender que se trata de auxílio incapacidade por acidente de trabalho B31 para B91). Por várias razões, de conhecimento público, a autarquia vem sofrendo com a falta de servidores públicos para analisar as demandas da ordem de quase 500 mil/ano.
O não julgamento da contestação por parte da autarquia, em desfavor da empresa, gera aumento do FAP. O trabalhador adquire estabilidade provisória de 12 meses pós-alta médica previdenciária, aumento nos custos de treinamento e reposição de mão de obra, aumento nos custos das rubricas trabalhistas (FGTS) etc. Passados mais de 10 anos, a empresa vem buscar a decisão sobre sua contestação por não ter sido notificada, até a presente data, sobre aquela decisão contestada.
Admitamos que o recurso, aqui chamado de contestação, tenha sido interposto, dentro de prazo, de forma correta, com as provas anexadas aos autos. A autarquia, por alguma inobservância, não deu seguimento a análise da contestação da Empresa e manteve a decisão da perícia médica, decidiu in pejus contra a Empresa que não foi notificada da decisão administrativa, ou seja, abrir prazo para defesa e esta arquiva o processo.
Passados os períodos de decadência e prescrição, a empresa vem, agora, arguir que seu pleito não fora analisado até o momento e requer apreciação do mérito. É dever da autarquia rever seus atos administrativos, conforme Lei 9784/99, por conter vício insanável, ou seja, a matéria não foi analisada in totum e admitamos que após a reabertura do processo e reanálise dos fatos e provas ali contidas, a autarquia ou o CRPS chega à conclusão de que a perícia médica federal se equivocou ou que o setor administrativo deixou de apreciar a contestação e profere decisão favorável à empresa.
É caso de afastar a intempestividade, a decadência e reverter a decisão antes desfavorável ao empregador para favorável. Contudo, a controversa não termina aqui. O FAP deve ser revisto, mesmo após cinco anos e seus efeitos devem ser restabelecidos. Que neste caso cremos que só em juízo, haja visto que a autarquia irá alegar a decadência e a prescrição mesmo havendo culpa da Administração.
(*) Fernando Braga é parceiro da BMS Projetos & Consultoria.