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Capitalismo de stakeholders tende a avançar com a padronização das informações ESG

A crise desencadeada pela pandemia da Covid-19 tende a ser seguida por outras, econômicas e climáticas, e tem feito o capitalismo “sentar no divã” para revisar seus tradicionais valores, incluindo temas como sustentabilidade, resiliência e inclusão. Esse é o princípio do capitalismo de stakeholders, tema que ganhou espaço em discussões internacionais como no Fórum Econômico Mundial, em Davos, e foi discutido no último dia 6 de abril no evento 2021 Stakeholder Capitalism Forum, organizado pela ESPM em parceria com a Stakeholder Relations Co.

“Os investidores estão aprendendo a navegar esse novo ambiente do chamado capitalismo de stakeholders ao tempo em que estão cobrando e sendo cobrados por mudanças.”, afirmou Fábio Coelho, Presidente Executivo da Amec, que participou do painel Investidores, ao lado de Regiane Abreu, Relações com Investidores da Light; e Marcos di Tullio, Analista de empresas da JGP Gestão. A mediação ficou a cargo de Virginia Gonçalves, Gerente de Report ESG do Itaú.

A proposta do capitalismo de stakeholder indica que o sucesso das companhias não se limita apenas à geração de lucro aos acionistas, mas que seja capaz também de incluir interesses de outros stakeholders: funcionários, comunidades locais e companhias da cadeia produtiva, dentre outros. Nesse contexto, os investidores têm um poder decisório fundamental no active ownership e podem exercer a propriedade de maneira ativa, por meio do voto, engajamento e relacionamento com as empresas.

O Presidente da Amec avaliou que, nesse processo de aprendizado dos investidores, nem todos estão no mesmo nível. “A realidade brasileira não é tão uniforme. Algumas casas estão se movimentando mais rapidamente por demanda de clientes, algumas por conta do avanço da regulação e outras simplesmente para cumprir requisitos do dever fiduciário”, disse.

Apesar das diferentes realidades dos investidores, uma variável fundamental no Brasil será a ação dos órgãos reguladores, na opinião de Fábio Coelho.  “Considerando a escassez de informação sobre aspectos não financeiros dos negócios, quem tem uma base de dados organizada já apresenta uma vantagem competitiva. O fato de não haver uma regulação que diz onde e o que deve ser divulgado nos leva a conviver com uma sopa de letrinhas e diferentes padrões de disclosure, como os formatos GRI, SASB, TCFD, CDP, entre outros. Vamos conviver nos próximos anos com esse processo de aculturamento antes de chegar à comoditização da informação no país”, avaliou.

Os convidados debateram sobre a dificuldade de avaliar as informações ESG das empresas brasileiras quando a proposta é comparar pares de um mesmo setor. Nesse ponto, a falta de padronização é considerada um obstáculo, tanto do lado de quem analisa para investir como também por parte da empresa que provê esses dados. A falta de padrões faz com que as empresas coloquem as informações em diferentes documentos: relatórios específicos, formulários CVM, relatório anual e site. “Há um desafio de comunicação para o investidor que está aprendendo e que cada vez tem um documento diferente para analisar”, disse o representante da Amec.

Do lado das empresas, a analista de Relações com Investidores da Light também defendeu a padronização, por conta do excesso de demanda por informações dos investidores. “Recebemos planilhas e questionários para preencher, calls, frameworks para report, além da CVM exigir um disclosure maior dos temas ESG em formulários e informes. São demandas similares, mas não idênticas porque não há um padrão”, afirmou Regiane.

Materialidade

Fábio Coelho lembrou que os aspectos abstratos e subjetivos na avaliação das informações tendem a ser transformados em números pelos investidores, ou seja, em ranking, nota ou rating, justamente para tornar claro o senso de risco e prioridade do investimento. Essa quantificação também deve ser acompanhada do conceito de materialidade das informações, que é definida pelo peso dado a diferentes indicadores, dependendo do setor e tipo de negócio de uma empresa.

“O investidor pode ter diversas leituras sobre uma mesma empresa, dependendo dos objetivos de longo ou curto prazo, e definir pesos diferentes de acordo com o que é importante para a carteira dele. Também pode optar pela análise internamente ou pela contratação de uma consultoria especializada”, disse.

O importante é saber quais são os fatores de peso mais importantes para que seja possível montar critérios de materialidade que são relevantes em cada gestora de recursos. Esse processo de análise também caminha junto com a comunicação e o engajamento, que ocorrem em reuniões específicas nas quais os investidores têm a oportunidade de trazer demandas para as empresas em relação às ações de sustentabilidade, formação de comitês e informações que deveriam estar no report.

Marcos di Tullio, da JGP, contou que a materialidade é um dos pilares do processo de análise da asset, com avaliação de indicador ESG que realmente é importante para o setor de cada empresa. “Estudamos a fundo setores para entender os pontos críticos no ambiental, no social e na governança, pois não queremos questionar a empresa no indicador que é irrelevante para ela”, explicou.

Como exemplo, disse que ao avaliar um banco, não questiona o consumo de energia pelas agências, pois o impacto é menor do que o processo de avaliação realizado pela instituição ao emprestar dinheiro para empresas. O principal problema que o analista da JGP enxerga hoje é em relação à padronização das informações.

“A maioria das empresas não tem clareza do que necessita divulgar. Quando comparamos duas empresas do mesmo setor, observamos informações que não são comparáveis e critérios distintos. Para resolver esse problema, mantemos uma postura colaborativa com as empresas e marcamos reuniões para mostrar o que consideramos material para o setor, o que tem recebido aceitação de todos”, relatou.

Outro ponto importante, na visão de Marcos di Tullio, é que o ESG deve permear as decisões do management, com o próprio CEO utilizando os critérios de forma estratégica na tomada de decisões. “Quando questionamos o CEO e ele nos direciona ao diretor de sustentabilidade, isso demonstra que a liderança não está entendendo a importância da sustentabilidade para a empresa como um todo”, concluiu.

Fonte: AMEC, em 11.04.2021