Não há programas públicos que funcionem em ambiente corrupto, afirmou Marcelo Bretas no Fórum de Compliance da Amcham
O combate à corrupção tem que ser a grande prioridade do Brasil, defende o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal no Rio de Janeiro. “A principal pauta tem que ser o combate à corrupção. Porque não há programa de construção de moradia, de criação de empregos, de fornecimento de alimentos, que subsista a um ambiente corrupto”, disse, no 5º Fórum de Compliance da Amcham-São Paulo na sexta-feira (17/8).
“É comum ouvir dizer que o Brasil tem que ter outras pautas que não a luta contra a corrupção. Pois eu ouso discordar”, assinala. Bretas é um dos juízes responsáveis por casos da Lava Jato e Operação Fatura Exposta – que apura irregularidades no fornecimento de equipamentos médicos ao Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO) – no Rio de Janeiro.
O juiz compara a corrupção a um cano furado, onde a maior parte da água é desviada. “Só uma pequena quantidade chega ao outro lado. É preciso fechar esses buracos, esse ralo por onde o dinheiro público é escoado. E que normalmente é para fora do país.”
A má qualidade dos serviços públicos é uma das consequências, continua Bretas. “Os hospitais não estão recebendo valores, o transporte público está caindo aos pedaços e não há segurança. É um quadro muito influenciado pelo desvio de dinheiro público, e ainda tem pessoas que defendem que corrupção não é um crime grave.”
Mudança cultural
Para Bretas, a chegada da lei anticorrupção deu mais subsídios à Justiça para enfrentar desvios. A penalização a empresas infratoras, por exemplo, ficou mais severa e próxima à regulação dos EUA. “As sentenças aqui eram ínfimas, se comparadas às norte-americanas. Lá, uma condenação por ato ilícito realmente inibe a prática de ilegalidade.”
Com a Justiça agindo com mais rigor, tem havido uma mudança de mentalidade, com empresas adotando estruturas de governança e integridade. “Hoje, me parece que tem sedimentado no Poder Judiciário a importância de se responsabilizar de forma decente e efetiva as empresas que permitem práticas de crime por seus agentes”, observa.
Por outro lado, as empresas também têm que levar em conta as perdas com atos ilícitos e avaliar seus efeitos. “Também acho importante que as empresas que quiserem fazer negócios no Brasil passem a contabilizar o custo-corrupção”, sugere.
Outro aspecto positivo da lei foi o incentivo a acordos de colaboração premiada. Para Bretas, a medida trouxe a negociação para dentro do processo. “O juiz pode conversar com o advogado do cliente e pedir para ele reparar o dano, em troca de uma compensação na sentença”, detalha.
Em relação aos recentes episódios de combate à corrupção no Rio de Janeiro, como as operações Lava Jato e Fatura Exposta, Bretas disse que ainda não percebe uma mudança nas relações público-privadas. “Ainda não tenho essa sensação. O que vai haver é mais transparência no diálogo, principalmente porque o Judiciário vem atuando com mais firmeza.”
Fonte: Amcham-São Paulo, em 20.08.2018