Por Luciano De Biasi (*)
O crescimento de um país é possível quando transações ocorrem num ambiente estruturado e estável que proporcione a geração de riqueza e uma distribuição de renda mais justa. Para tanto, é necessário que uma sociedade tenha valores indispensáveis como seu baluarte e o principal deles é a confiança.
Para que uma economia funcione de forma eficiente, é preciso um grau razoável de confiança nos propósitos e atos de instituições governamentais e das organizações do setor privado.
Sem confiança, nada se estabelece com solidez; incertezas aumentam riscos, que por sua vez aumentam o custo de transação entre as partes, transações essas que conectam governos, empresas e pessoas. Essas transações deveriam ocorrer em ambiente de negócios saudável, com o estabelecimento e o cumprimento de regras claras que mitigam riscos e estabilizam as relações entre os entes econômicos.
Nesse sentido é que governos de países mais desenvolvidos têm exigido maior rigidez no cumprimento de regras e na transparência de relações entre entidades e pessoas.
Esse movimento, ainda que timidamente, tem ocorrido no Brasil. Entidades e empresas têm se organizado com o intuito de fortalecerem suas políticas de governança, muito na esteira das políticas de suas matrizes internacionais. Porém, a grande pressão por mudanças também ocorreu graças à Lava-Jato.
Segundo a Transparência Internacional (relatório: Integridade e empresas no Brasil, 2018), a lista de empresas punidas por ano por irregularidades em licitações saltou de 313 em 2013 para 3.070 em 2017. Adicionalmente, estudos da Transparência Internacional apontam também que corrupção inviabiliza a democracia. O Relatório de Percepção de Corrupção de 2018 demonstra que nenhum país com democracia desenvolvida tem índice abaixo de 50 (o Brasil atingiu apenas 35).
Portanto, quanto mais corrupta é uma nação, menos chances de desenvolvimento econômico ela tem, devido aos riscos e custos de negociação.
Por conta do novo ambiente de compliance resultante em muito da reação positiva da sociedade brasileira às investigações da Lava-Jato, empresas têm investido em políticas internas de relações com clientes, fornecedores, colaboradores e governos que visam estabelecer regras éticas e transparentes de relacionamento com seus stakeholders. De acordo com pesquisa realizada pela Amcham, 60% das empresas aumentaram seus investimentos em compliance, sendo do que 46% destes relataram ter sofrido forte pressão para tanto desde o início das operações da Lava-Jato.
Contudo, em março, assistimos, atônitos, aos ministros da Segunda Turma do STF decidirem por enfraquecer as chances de punições ao transferir, para um tribunal de menor expressão, os processos de corrupção envolvendo políticos, processos os quais contêm a suspeita de caixa 2; ou seja, praticamente todos, abrindo brechas para a soltura de condenados a centenas de anos de prisão, bem como dificultando possíveis punições daquele que estão sendo investigados.
Portanto, a decisão do STF indica o abandono, pelas autoridades legais do Brasil, de uma política mais austera em linha com a tendência mundial em governança liderada pelos países de primeiro mundo, sugerindo que, no Brasil, o ambiente de negócios continuará poluído com relações espúrias, distorcendo as relações negociais, a economia, aumentando o risco e por consequência o custo de se fazer negócios no Brasil. Enfim, apesar do placar apertado, esse 6×5 doeu muito mais do que os 7×1.
(*) Luciano De Biasi é formado em Ciências Contábeis pela Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP), mestre em Ciências Contábeis pela Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap) e sócio-diretor da De Biasi Auditoria, Consultoria e Outsourcing.
Fonte: Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo, em 23.04.2019.