Por Paulo Leão de Moura Jr. (*)
Com as preocupações e urgência pelas questões de proteção ao meio-ambiente, das mudanças climáticas e da preservação da natureza, surgiu uma tendência do mercado financeiro em aplicar recursos em empresas e projetos que, preferencialmente, absorvam a causa ecológica. São investimentos em atividades sérias com propósitos honestos e com boa governança que priorizam a defesa ao meio-ambiente, as questões sociais e de apoio às forças de trabalho.
Surgem, assim, as empresas ESG – Enviroment, Social and Governance que ora chegam ao Brasil.
Esse movimento começa no anos 80 do século passado, nos EUA, com a introdução da prática do ERM, Enterprise Risk Management, que incluía em suas atividades as questões de proteção ao meio-ambiente e, certamente, as questões sociais para a manutenção das forças de trabalho com enfoque maior na Governança e na introdução de normas de Compliance. Portanto, incluía a tratativa para os riscos puros e dos riscos especulativos e se mantem assim até hoje.
Não se imagina mais empresas americanas, inglesas, europeias e japonesas que não adotem ou não atuem dentro do sistema ERM, especialmente, na tratativa dos riscos especulativos.
A ESG surge da constatação dos grandes centros financeiros de que as empresas que priorizavam as questões de meio-ambiente, que tinham política social de apoio, de estimulo para a qualidade das suas forças de trabalho, baseadas em sistema de Governança, apresentavam um crescimento sustentável e com resultados superiores. Daí, o interesse em investir nesse tipo de empresa.
Com as atenções focadas no meio-ambiente e no respeito aos direitos individuais, renovam-se a necessidade e a importância da análise dos riscos consequentes e inerentes a qualquer atividade empresarial que cause provável perigo ou ameaça física ou moral para o homem e para a natureza.
Em matéria de riscos, é óbvia a imperativa aplicação e uso sistemático do gerenciamento de risco básico, GRB, para a tratativa dos riscos ao meio-ambiente, aos colaboradores da empresa e para a sociedade em geral. Necessária, também, uma cuidadosa análise sociológica e histórica, pois, tratamos de comportamentos humanos. Já os riscos inerentes e consequentes da Governança - que, em tese, tudo deveria considerar - devem ser analisados de acordo com a ERM combinada com a GRB.
Como consequência à identificação e avaliação desses riscos, impõem-se as tratativas para evitar e minimizar as perdas e danos à natureza. As tratativas resultantes das análises vão desde evitar até minimizar o risco adotando medidas de controle para diminuir o impacto, com investimentos bem calculados para prevenção, segurança física, adoções de ações que valorizem o esforço de salvaguarda ao meio-ambiente e à própria empresa até a transferência do risco ao seguro. Aos poucos, o seguro propõe a proteção ao meio-ambiente.
Com as recentes medidas de abertura do mercado – a consulta pública sobre a norma dos seguros de responsabilidade civil – a livre negociação de cláusulas e condições, é bem provável que o mercado segurador se abra mais à aceitação desse risco.
O Brasil tem conjunto de leis, decretos, resoluções estudos e pareceres diversos para a questão do meio-ambiente. Nossa legislação sobre o assunto é considerada como uma das melhores do mundo: Lei 6.938 de 17.01.1981, Política Nacional de Meio-Ambiente; Lei 9.605 de 1998, Lei de Crimes Ambientais, a criação de Compliance Ambiental. Todas ainda objeto de grandes polêmicas, principalmente, por conta de antagonismos entre ruralistas e ambientalistas.
Temos seguro de Meio-Ambiente fundamentado pelas leis brasileiras que apresenta condições razoáveis de cobertura. Permanece o ordinário no nosso país: temos as leis, temos condições para realizar um bom seguro, porém, não temos a preocupação das empresas com seus riscos ambientais nem tampouco o interesse das seguradoras para aceitar e assumir o risco de danos ao meio-ambiente, principalmente, depois da ocorrência de eventos catastróficos recentes.
A procura das empresas pelo padrão ESG poderá determinar um interesse maior pela gerência de risco e, eventualmente, com o seguro. A liberdade de negociação prometida pela Susep, também, poderá determinar que seguradoras e resseguradoras aumentem seu apetite para aceitar e assumir os riscos de perdas e danos ao meio-ambiente, incluídas as coberturas mais específicas para poluição súbita e gradual.
O que não se pode admitir é a concessão de título “E” unicamente para a campanha de marketing da empresa. A empresa deverá de forma transparente e ética demonstrar que atua em proteção, segurança e gerenciamento de seus riscos ao meio-ambiente.
O “S”, teoricamente mais simples, é o investimento nos empregados da empresa. Vai além dos benefícios elencados; tem a ver com comportamento geral da empresa em relação aos seus colaboradores e à sociedade. Aqui é importante considerar a realidade atual com ênfase maior ao respeito individual. A empresa, com seus desafios, propósitos e metas, tem que reconhecer que só atingirá os objetivos com o total apoio dos seus funcionários e colaboradores. Deve-se entender que os relacionamentos interpessoais são a base do trabalho, que a união de vários indivíduos diferentes dentro do ambiente corporativo é essencial para o desenvolvimento da empresa. Essa relação deve ter como norte o respeito ao ser humano com todas as suas peculiaridades.
Ao mesmo tempo que a empresa determina a excelência que se espera dos seus colaboradores, deve oferecer um ambiente de trabalho em condições adequadas gerando benefícios. Atualmente, nas empresas modernas, o setor mais importante é o Recursos Humanos. A empresa que consegue alinhar sua visão e seu propósito com as metas do setor de RH, certamente, será uma empresa vencedora onde qualquer pessoa deseja trabalhar.
O RH deve nortear, com total apoio do conselho, da diretoria e dos acionistas, as normas de comportamento básico da empresa, o que espera de todos. Devem estar salientados os valores e princípios como empatia, honestidade, cordialidade, ética, trabalho em equipe, pontualidade. A empresa, por sua vez, deve estar preparada para respeitar as individualidades de cada um e, também, para não tolerar preconceitos de raça, gênero, sexualidade, etarismo, religião, beleza, ocupação, ou qualquer que seja. Haverá respeito em todos os sentidos, não havendo espaço para assédios moral ou sexual, tão somente o mérito, os comportamentos profissional e social deverão prevalecer.
Todo o esclarecimento necessário aos colaboradores para que possam atuar de forma natural e profissional às determinações da empresa quanto ao Compliance. Todos os integrantes da empresa, independente de cargo ou função, devem acatar as normas.
É imprescindível para o desenvolvimento de qualquer empresa, a implantação de política justa e correta de cargos e salários de forma a proporcionar um claro estímulo e condições ao desenvolvimento do colaborador.
Além disso, adicionar todos os instrumentos de apoio material que a Lei ou situação permitam: seguros de Vida e Saúde e outros benefícios legalmente previstos. Há ainda, o apoio para as atividades dos colaboradores mediante a manutenção de seguros de responsabilidade civil E&O, Erros & Omissões, D&O Diretores e Gerentes garantindo as falhas que possam causar danos a terceiros.
Essas são as condições mínimas necessárias para uma empresa poder ter o “S” genuinamente.
Empresas, privadas ou não, não são instituições de caridade. São instituições a procura do seu objetivo maior e legítimo que é de proporcionar lucro aos seus acionistas. É a norma básica do capitalismo e do neoliberalismo. No entanto, independente desse objetivo magno, atualmente, empresas que adotam o ESG são competitivamente melhores e, consequentemente, mais lucrativas como entendem os investidores e financiadores, estes sim, visando exclusivamente o lucro.
Colaboradores satisfeitos, orgulhosos de participarem no desenvolvimento de uma empresa, protegidos, apoiados e cientes da possibilidade de desenvolvimento profissional por mérito e por experiência, certamente, proporcionarão a melhor prestação de serviço ou produto aos seus clientes.
Chegamos, enfim, ao “G”. A famosa Governança. A governança existe desde a Idade Média: encontramos no trabalho feminino, nas estratégias de guerras, e nas guildas onde profissionais em igualdade de condições usavam normas para proteger os seus interesses e manter os privilégios conquistados. Como entendemos hoje, o conceito de governança é consequência da introdução do ERM, Enterprise Risk Management, lá pelos anos 60, pela influência das normas ISO e, posteriormente, das normas COSO.
A Risk and Insurance Management Society, RIMS, foi e é uma das grandes impulsionadoras do ERM. A enorme crise financeira de 2008 nos EUA estimulou o conceito de Governança. Essa crise escancarou a total desordem administrativa empresarial, principalmente, nas operações das instituições financeiras. O impacto generalizado dos prejuízos foi comparado com a depressão de 1932. Por pressão do governo americano e pressão política internacional, foi implantada a política da Governança Empresarial e, mais importante, a introdução do sistema de Compliance que determina a forma de atuação da empresa, a conformidade estrita com as normas, atos e legislação que a regem e permitem a análise das tratativas de riscos inerentes às suas operações, quaisquer que sejam, puros ou especulativos. Impede a corrupção e determina os procedimentos corretos, sérios, justos para proteger a empresa de inúmeros riscos que possam impactar em sua sustentabilidade e solvência.
Assim, uma empresa bem administrada pode ostentar a sigla ESG. Seguindo e obedecendo todas as normas de Governança, com ênfase no ERM, no Compliance, com adesão dos conselheiros, diretores e acionistas ao comportamento sério e permanente dessas políticas, certamente, uma empresa merecerá o “G”.
O que não se pode admitir, repito, é a sigla ser usada como mera campanha de propaganda e marketing por qualquer instituição. É absolutamente necessário que a empresa seja transparente para demonstrar a adesão dos seus critérios sólidos e corretos de Governança, com acompanhamento de um Compliance correto e independente.
Não se pode admitir, ainda, que uma empresa que adere à sua robusta política de administração venha, por seus conselheiros, diretores ou acionistas, atuar e contrariar as normas como, no passado, assistimos com empresas brasileiras.
Não é fácil para as empresas merecerem a sigla ESG e, mais difícil ainda, mantê-la ante às imensas dificuldades políticas, econômicas, financeiras e sociais enfrentadas por nosso país.
(*) Paulo Leão de Moura Jr. é formado em História e Sociologia pela Universidade de Boston, com mais de 63 anos de experiência no Mercado de Seguros. Possui várias especializações em Seguros e Resseguros por entidades brasileiras e no Exterior: AETNA Group, IRB Re, FGV-SP, Insurance Achievement, FENASEG, ALARYS. Gerente de Risco, ARM ALARYS, é membro da Associação Brasileira de Gerenciamento de Riscos, ABGR, e também do RIMS, Risk Management Insurance Society, da APTS. Recebeu premiações do Mercado de Seguros em reconhecimento pela sua atuação marcante e de longos anos nas áreas de Seguros e Resseguros. Sócio fundador da Power Corretora de Seguros, Inspector Assessoria Técnica e Catalyst Re, agora Chairman da THB Brasil desde 2010.