Por Giovanna Silveira Franco (*)
O Compliance que conhecemos já não é o mesmo. Na mesma velocidade em que o termo ganhou popularidade, suas vertentes vêm ganhando novos vieses e mostrando que não se trata apenas de uma área profissional ou de um setor dentro das empresas, mas de um conjunto de boas práticas de gestão empresarial, que têm como um de seus aspectos, e não mais se limitando a ele, a prática anticorrupção. O que se percebe, atualmente, é a consolidação do entendimento de que para que um negócio seja ético e responsável, este deve, na mesma medida, estar comprometido com questões ambientais, humanas e sociais. Portanto, o Compliance vem se mostrando uma ferramenta eficaz para a construção e o fortalecimento da Cultura Organizacional Ética e Sustentável, voltada para dentro e para fora do negócio, em três níveis de conformidade: dos colaboradores e demais envolvidos na atividade para com as normas e valores internos da empresa, desta com as leis do país, e do negócio para com o meio, a sociedade e o mundo.
A conexão entre ética, anticorrupção, direitos sociais, humanos, ambientais e sustentabilidade não é novidade, mas sim a prática integralizada dessas vertentes dentro das organizações. Essa mudança de panorama decorre do aumento do nível de maturidade do Compliance no Brasil, que vem levando muitas empresas a compreender a responsabilidade que possuem em influenciar positivamente o meio ao seu redor para que toda a cadeia funcione adequadamente. Não basta que uma empresa, isoladamente, esteja em conformidade, se há todo um mercado contaminado com práticas violadoras. Neste sentido, cabe também a cada empresa contribuir para disseminar as boas práticas no mercado.
A fim de compreender melhor toda essa dinâmica, faz-se necessária uma breve retrospectiva história sobre o que deu origem aos termos supracitados.
Desde 1992, a Organização das Nações Unidas vem liderando a luta mundial pelos direitos humanos, sociais e ambientais, lançando diretrizes por meio das Agendas Globais, que estabelecem os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que deverão ser perseguidos pelas empresas.
Em 2004, outro termo, o ESG, ganhou destaque no cenário mundial por meio de publicação do Pacto Global em parceria com o Banco Mundial, chamada Who Cares Wins. A sigla em inglês significa environmental, social and governance e corresponde às práticas ambientais, sociais e de governança de uma organização. Desde então, atuar de acordo com os preceitos do ESG incentiva a competitividade do setor empresarial, seja no mercado interno ou no exterior. No mundo atual, no qual as empresas são acompanhadas de perto pelos seus diversos stakeholders, ESG é a indicação de solidez, segurança, melhor reputação e maior resiliência em meio às incertezas e vulnerabilidades.
Os adventos históricos das Agendas da ONU e do ESG impactaram significamente a forma de fazer negócios. As empresas, principalmente as maiores, passaram a ter de se preocupar com o Desenvolvimento Sustentável e trazê-lo para dentro da tomada de decisões estratégicas, pois este se tornou um requisito indispensável para a imagem e reputação do negócio, para que passe segurança e credibilidade aos seus parceiros, acionistas e até clientes. O comportamento do consumidor também mudou, passando a atribuir maior valor aos serviços e produtos de empresas comprometidas com a preservação do meio ambiente e prevenção às violações dos Direitos Humanos. Em suma, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável mudaram o rumo dos negócios definitivamente, evidenciando uma única via para o crescimento empresarial: caminhar em direção à sustentabilidade, fadando os que não o fizerem ao fracasso.
O Compliance foi e continua sendo o grande aliado e a principal ferramenta do negócio para construir e fortalecer a Cultura Organizacional Ética e Sustentável dentro e fora da empresa. Isso se faz pela incorporação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável na missão, valores e objetivos da organização, refletidos nas normas e valores internos e repassados a colaboradores, parceiros, fornecedores, clientes e a toda a cadeia envolvida na atividade.
O que se percebe, como fruto dessa prática e do aumento de maturidade dos Programas de Compliance, é que há uma evidente relação entre as boas práticas ambientais, humanas e sociais e a diminuição da corrupção, o que ocorre no momento em que a empresa muda o padrão de comportamento focado no capital e no curto prazo, para um posicionamento a longo prazo, tendo o capital como um aliado e a liderança voltada à missão social e ética, preocupada com o coletivo. Neste cenário, somam-se à responsabilidade social das empresas, a função socioambiental e as relações éticas que produzem no âmbito de suas atividades.
Portanto, não há qualquer dúvida a respeito da indissociabilidade entre anticorrupção e sustentabilidade na gestão empresarial e do papel do Compliance em servir como ferramenta para esse alcance em nível interno e externo à empresa.
(*) Giovanna Silveira Franco é Analista de Compliance Jr. da Compliance Control. Já atuou na área de Compliance, em uma multinacional francesa e certificação em Compliance Anticorrupção pela LEC. Experiências profissionais anteriores em Propriedade Intelectual, Falência e Recuperação Judicial e Psicologia Comportalmental. Secretária Geral do Instituto de Direito Comparado Brasil-Japão e do Instituto Brasileiro de Propriedade Intelectual, desde 2021.
08.08.2022