Fábio de Almeida Braga1
Em deliberação de 27 de dezembro último, a Diretoria do BNDES, com a edição da Resolução 3.439, alterou as “Disposições Aplicáveis aos Contratos do BNDES”, determinando a obrigatoriedade de que os bancos que atuam como agentes financeiros nas operações realizadas com recursos providos pelo banco de desenvolvimento passem a colher evidências e dar comprovação de que adotam procedimentos voltados à observância das regras de prevenção à lavagem de dinheiro (PLD) e ao combate do financiamento ao terrorismo (CFT).
Os bancos passam a estar obrigados a comprovar que dispõem e colocam em prática programas de integridade, políticas e procedimentos de PLD, CFT, além de mitigação de situações fraudulentas, incluindo aquelas enquadráveis nas hipóteses da Lei Anticorrupção (L. 12.846/13). Nada disso é, em si, uma novidade, pois os bancos desde a entrada em vigor da Lei 9.613 e, posteriormente, da edição da Circular 3.461/09, já devem adotar, em suas operações, procedimentos próprios aos temas de PLD e CFT.
A constante expectativa em torno da atuação diligente dos agentes financeiros decorre do contínuo surgimento de situações potencialmente criminosas e que requerem, de tempos em tempos, a implementação de novas práticas de controle de riscos decorrentes desses temas.
É exatamente o que ocorre neste momento, em que o BNDES atua em consonância com a evolução das discussões sobre a revisão contínua desse marco regulatório, quer entre nós – especialmente através das ações da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla) -, quer nos mercados internacionais.
Além dessa nova postura exigida pelo BNDES, os bancos têm sido chamados a acompanhar outras mudanças no marco regulatório de PLD e CFT. Até 18 de março, o Banco Central manterá sob audiência pública uma proposta de circular para comentários e sugestões, segundo a qual se tornará obrigatória a adoção de um novo padrão de gerenciamento de questões ligadas à PLD e ao CFT.
A minuta de circular proposta aborda pontos relevantes e busca aprimorar o controle sobre o risco de que as atividades dos bancos sejam afetadas por situações de lavagem de dinheiro ou financiamento irregular de atividades ilícitas.
Se fosse editada desde já e sem alterações, a circular ensejaria uma detalhada revisão de políticas, procedimentos e controles internos, passando a ser obrigatória a adoção de conteúdos mínimos para regras operacionais internas dos bancos. A nova disciplina tornaria obrigatória a fixação de critérios claros e objetivos de identificação, qualificação e classificação de risco de clientes e usuários dos produtos e serviços dos bancos.
Os bancos estariam obrigados a criar diretrizes para definição de funções, atribuições e responsabilidades em suas estruturas de governança, do mesmo jeito que novos produtos e serviços passariam a ser objeto de maior atenção sob a ótica de PLD e CFT.
Avaliações internas de risco e de efetividade no cumprimento de políticas, procedimentos e controles internos, assim como a capacitação de funcionários, prestadores de serviços terceirizados, correspondentes bancários e parceiros de negócios seriam colocadas como pontos essenciais no rol de itens do conteúdo mínimo da política de PLD e CFT de qualquer banco.
Levada a efeito a pretendida revisão do marco regulatório, o supervisor bancário elevaria o grau de eficiência e efetividade dos procedimentos e dos controles utilizados atualmente pelos bancos com o objetivo de aprimorar sua postura em relação à PLD e ao CFT, em benefício de todo o Sistema Financeiro Nacional.
Tudo isso amolda-se à certificação de cumprimento de regras de administração e operação bancária. Mais recentemente, o dever de implementação e manutenção de regras de conformidade passou a integrar o rol de itens de observância obrigatória dos bancos, com a Resolução 4.595/17, que disciplinou a chamada Política de Conformidade ou de Compliance.
Para colocarem as regras previstas em sua Política de Compliance em prática, inclusive as relativas a PLD e CFT, as instituições passaram a considerar uma postura de gerenciamento de risco de conformidade mais integrada com o controle das demais fontes de risco da operação bancária, conforme exigido pela Resolução 4.557.
Para tanto, é necessária a realização de um mapeamento de todas as possíveis manifestações de risco de conformidade, com a divisão clara de responsabilidades entre os membros da administração e da própria operação do banco, inclusive com a finalidade de se evitarem os riscos de conflitos de interesses.
Definidos papeis e responsabilidades, o banco deve criar regras de conformidade compatíveis com aspectos práticos de sua atividade, tais como volume de operações, modelo de negócios e perfil de risco, sempre atento para estruturar a sua área de Compliance com a alocação de quantidade e qualidade adequadas de recursos humanos e materiais para o cumprimento das regras de suas várias políticas e todos os seus procedimentos operacionais.
Toda a atuação do pessoal dedicado às funções de Compliance de um banco deve estar cercada de cuidados que assegurem a independência e a autoridade funcional dos membros da equipe, de maneira que tenham, constantemente, livre acesso a dados, documentos, informações e demais elementos necessários ao desempenho do controle de conformidade, assim como possam se manifestar sempre de modo livre e independente, inclusive perante o próprio Banco Central.
Com isso e contando com o sólido e contínuo compromisso da administração, além de se disseminar em toda a organização uma preocupação com os critérios de conformidade, certamente aumentam as condições práticas para a implantação constante de uma cultura de Compliance nos bancos.
1Fábio de Almeida Braga é sócio de bancário do Demarest.
Fonte: Estadão, em 18.02.2019.